Não sabemos em que dia nasceste, nem o ano. Sabemos que eras uma jovem adulta, poderias ter um ou dois anos de vida e estás connosco faz hoje três anos.
Vi-te pela primeira vez no dia 1 de abril de 2003, à tarde, quando fui passear com o Diogo à mata. Andavas por ali a brincar com um outro cão cujo dono se mantinha perto, mas dos teus donos nem rasto. Passado algum tempo afastaram-se e tu centraste a atenção em nós. Eras muito viva, muito ágil, e depressa estabeleceste uma boa relação com o meu cão. Depois reparei que a coleira - sem identificação - que te cingia o magro pescoço estava apertadíssima e foi com dificuldade que consegui abri-la e devolver-te o espaço que te era necessário. Deixei-a pendurada num arbusto à beira do caminho e tentei afastar-me mas tu seguiste-me.
Não estava nos meus planos trazer mais quatro patas para casa, com a agravante de serem do género feminino, e dada a tua insistência em te juntares ao grupo pedi a um senhor que providencialmente ali passava que te segurasse para que eu pudesse regressar.
No dia seguinte, no primeiro passeio do dia, e ao chegar à mata, lá estavas tu, sentada, de frente para o portão, como que à minha espera. Ao ver-me, davas saltos de 'cão de circo', ganias, corrias desenfreada em círculos, mas sempre, sempre, no meu encalço sem nunca te separares de nós.
Dessa vez nem sequer tive coragem de pedir a algum passante que te segurasse e deixei que viesses comigo. Dei-te banho, desparasitei-te, levei-te à Clínica do Dr. A. Monteiro, - um grande amigo que trata dos meus cães quase há três décadas - foste vacinada, agendou-se a esterilização e cá estás tu, três anos passados, no conforto do lar, integrada na família.
Também não sei se tens reminiscências dos tempos em que andaste à deriva; suponho que sim. Há situações em que demonstras ter medo, há lugares aqui próximo de casa onde recusas ir, há pessoas que te inspiram terror e de quem foges...
Contaram-me depois que eras "aqui da zona" e que foste deixada à tua sorte aquando do plano de erradicação de barracas. Rasteirinha e rápida como és certamente fugiste aos funcionários da CMO que vieram apanhar os animais que sobraram.
Adquiriste hábitos de higiene, deixaste de me destruir o património, conheces todas as rotinas que te dizem respeito, identificas os sons da casa e sabes os meus gestos. E eu estou feliz por te ter recolhido e grata pela ternura com que me olhas!